A Aposentadoria sob duas perspectivas e o Exercício Profissional do Psicólogo

Publicado em : 13/05/2016

Autor : José Carlos Zanelli*

Vejamos, em breve reflexão, o fenômeno psicossocial da aposentadoria sob duas perspectivas. Uma delas, a depender da escolha do trabalhador, é o desejo de aposentar-se – às vezes, tão logo quanto seja possível. A outra, é não querer aposentar-se e postergar o desligamento tanto quanto for conveniente ou permitido. Ambas alternativas ou possibilidades têm claras implicações para o exercício do psicólogo profissional especializado em organizações e trabalho.

O desejo de aposentar-se tão logo quanto seja possível está, não poucas vezes, associado a imprudências, expectativas infundadas e decisões sem o preparo recomendável. Com isso, não queremos excluir a veracidade de disposições maturas relativas ao evento, que são construídas ao longo de uma vida. Entretanto, sabemos que nossas instituições (família, escolas, organizações de trabalho e outras), nas décadas recentes e anteriores, não favoreceram aprendizagens para o bem-estar no pós-carreira. As consequências disso refletem-se nos indicadores de adoecimento – entendido em sentido físico, psicológico e social – nos anos seguintes ao desligamento e não, necessariamente, ligados a demonstrações antecedentes de perda de saúde, enquanto ainda se trabalha formalmente. Há evidências de que a preparação, orientação ou educação para aposentadoria tem caráter preventivo contra danos. É claro, quanto antes as instituições mencionadas promoverem as aprendizagens para o bem-estar no pós-carreira, melhor. Portanto, compete a nós, psicólogos inseridos nas organizações de trabalho, iniciar o processo de prevenção, sempre que possível, ao receber o novo empregado ou servidor, no caso dos órgãos públicos. Como isso não tem sido praticado, por negligência da organização e/ou desconhecimento dos profissionais, ainda resta a alternativa de delinear e implantar um programa de preparação, orientação ou educação para aposentadoria nos moldes de ajuda prestada ao final da carreira, embora não seja o procedimento ideal. Tal programa auxilia na promoção do autoconhecimento e dos próprios cuidados, do reconhecimento de potencialidades e limitações, na prevenção de possíveis conflitos e, em especial, no apoio para que os aposentandos planejem seu futuro.

Não querer aposentar-se e postergar o desligamento, dentro do que é de direito, sabemos que também tem seus significados e, por suposto, suas decorrências para o indivíduo, grupo de trabalho, organização, família, contexto social imediato e sociedade. Compete, outra vez, atenção por parte dos psicólogos em exercício nas organizações. Um primeiro alerta diz respeito, em razão de estereótipos difundidos na cultura brasileira, a quanto os trabalhadores mais velhos são vistos mais como um problema (ou, até, estorvo) do que um potencial a ser preservado. Persiste o mito das dificuldades de aprendizagem, enquanto acumulam-se provas de que, em condições sadias de desenvolvimento, o cérebro não só não se torna mais lento com o passar do tempo como pode aprimorar seu funcionamento, à medida que mais e mais conexões são efetivadas. Diferenciam-se dois modelos de filosofias para práticas de gestão dos trabalhadores e de seu processo de envelhecimento: o modelo de depreciação e o modelo de conservação. Um pressupõe um descenso ou um declínio a partir da metade da carreira. O outro valoriza os trabalhadores de todas as idades – todos podem proporcionar proveitos para a organização, desde que sejam bem geridos e educados. Reconhecer, respeitar e educar as pessoas mais velhas propicia alicerces culturais para o planejamento de condições de trabalho adaptadas a elas. Moldar as condições pode permitir adequação às suas necessidades: trabalho em tempo parcial, horários flexíveis, teletrabalho e outras. Enfim, investigar as razões por que os trabalhadores mais velhos decidem se aposentar e os motivos pelos quais ficam nas organizações pode prover elementos relevantes para o exercício profissional do psicólogo.

De fato, estamos observando um número progressivo de efetivações de aposentadorias, que aumentará inevitavelmente nas próximas décadas. Nos limites deste texto, não é possível avançar a discussão das conseqüências psicológicas, sociais e econômicas do fenômeno. Há uma gama de conhecimentos e habilidades que devem ser alinhadas na formação profissional do psicólogo, com a finalidade de habilitá-lo adequadamente para as tarefas emergentes. Fica a pergunta: quando teremos as condições apropriadas de desenvolvimento das necessárias competências do psicólogo para enfrentar o recrudescimento do problema?

Ainda são muito restritos os espaços para o desenvolvimento das competências do psicólogo comprometido com o fenômeno psicossocial da aposentadoria. Entre os reduzidos espaços atuais, estão as oportunidades oferecidas por professores orientadores em programas de pós-graduação de algumas universidades brasileiras.

Como ambiente de intercâmbio de aprendizagens e debates, há o Congresso Brasileiro de Orientação para Aposentadoria (CONBOA), desde 2010, de dois em dois anos. Em 2016, o evento ocorrerá de 23 a 26 de novembro, em Florianópolis. A programação preliminar conta com dois workshops, oito cursos, seis conferências magistrais, duas mesas redondas, dez âmbitos de debates, duas sessões de exposição de livros e autógrafos, relatos de prática de PPAs em execução, relatos de pesquisa sobre aposentadoria, pôsteres.

Para saber mais sobre o “CONBOA 2016” Acesse os links abaixo. Faça seu pré-cadastro, receba informações e nos ajude a divulgar o evento aos interessados.

http://www.tecnoevento.com.br/conboa2016

* Prof. Dr. José Carlos Zanelli – [email protected]

Servidor docente aposentado da UFSC. Atualmente, professor e pesquisador da Faculdade Meridional (IMED) e Diretor do Instituto Zanelli – Saúde e Produtividade. Estuda e intervém nos processos de aposentadoria desde 1993. Planejou e presidiu todas as edições do CONBOA – Congresso Brasileiro de Orientação para Aposentadoria.