Psicologia X Administração: faz sentido delimitar os espaços?

 Por Daniela Campos Bahia Moscon

Trabalhei mais de 11 anos diretamente na área de Gestão de Pessoas em algumas organizações. Sou Psicóloga e ensinei mais de 10 anos na formação de novos psicólogos. Tenho mestrado e doutorado em Administração e atualmente faço parte do quadro de professores da Escola de Administração da UFBA. Por que comecei falando brevemente desse meu currículo? Justamente porque sou fruto desse casamento, que muitos querem que migre para um divórcio, no estudo e na prática profissional relativa ao estudo e gerenciamento do comportamento humano no trabalho: Psicologia e Administração. E é desse lugar que farei aqui algumas breves reflexões.

Quem administra algo, o faz com o objetivo de aplicar métodos que permitam o alcance de determinados resultados previstos. Para esse alcance é necessário conduzir os recursos, e principalmente as pessoas, nessa direção, inclusive porque depende delas o correto direcionamento de tais recursos. Em última instância, portanto, a tarefa precípua de um (a) administrador (a) é gerir pessoas em toda a sua complexidade. Gerir pessoas implica em poder prever, mesmo que com grande margem de erro, sua probabilidade de agir de determinadas maneiras e os efeitos dessas ações na sua saúde, em especial na saúde mental. Desse modo, entende-se que que administrar envolve a necessidade de conhecer sobre comportamento humano, objeto de estudo da Psicologia. Essa linha de raciocínio nos faria pensar que a Psicologia fornece os meios para que a Administração se dê de forma eficaz.

Mas vamos inverter o raciocínio. A Psicologia é um campo que se dedica a estudar o comportamento humano (ou a subjetividade humana) em todo tipo de contexto social. Pela centralidade que o trabalho ocupa na nossa sociedade, compreender como isso ocorre nos espaços laborais se faz imprescindível. Assim, mesmo psicólogos (as) clínicos precisam compreender o mundo do trabalho e das organizações para avaliar suas repercussões na vida psíquica dos seus pacientes. Dessa forma, poderíamos entender que a Administração, enquanto um campo que se propõe, dentre outras coisas, a desenhar os processos de trabalho e as dinâmicas de funcionamento das organizações, oferece elementos que são indispensáveis para o trabalho do psicólogo, em qualquer contexto.

Ambos os raciocínios partem de uma visão da ciência que, ao meu ver, é fragmentada, e fruto de uma visão de campo de trabalho corporativista. Se a multi e a interdisciplinaridade ainda nos colocam grandes desafios, pensar em uma ciência transdisciplinar nos parece uma utopia. Uma utopia que precisará se tornar realidade se quisermos ter chances de lidar com um mundo do trabalho cada vez mais complexo, onde as fronteiras organizacionais são cada vez mais borradas e novos arranjos de trabalho surgem a cada minuto. A palavra complexo vem de plexus, entrelaçado, tecido em conjunto. Para enfrentá-la, portanto, precisaremos entrelaçar não apenas a Psicologia e a Administração, mas também a Sociologia, a Economia, a Ciência Política, as Ciências da Saúde, e tantas outras. O futuro é transdisciplinar, o que implica não apenas em reciprocidade entre as disciplinas, mas sua colocação em um sistema sem limites rígidos entre elas. E qualquer proposta de briga por espaços por parte de Psicólogos (as) e Administradores (as) vai de encontro ao que efetivamente o mundo do trabalho busca em termos de respostas transdisciplinares e voltadas a esses desafios complexos.

E afinal? Trabalhar na Administração me faz menos Psicóloga? Vocês já sabem o que penso disso. Vamos em frente.